2014/03/22

Dia Mundial da Água - "A Água nos Açores"


Francisco Cota Rodrigues
Universidade dos Açores
Departamento de Ciências Agrárias

Os recursos hídricos, para além de essenciais à vida, são um dos principais fatores do desenvolvimento económico. 

Um dos grandes desafios que se colocam aos Açores prende-se com a valorização do recurso água. A exiguidade territorial do arquipélago, aliada à vulnerabilidade dos sistemas hídricos, justificam estratégias de actuação activas, tendentes a aprofundar conhecimentos, integrar a exploração e apostar na sustentabilidade.

A ocorrência de água nos Açores apresenta características próprias, diferenciadas das que surgem em territórios contínuos, hidrogeologicamente homogéneos. Essas particularidades relacionam-se com especificidades climáticas locais, que marcam processos de precipitação e evapotranspiração diferenciais e com a geologia e geomorfologia dos terrenos, que para além de conformarem o escoamento superficial induzem no corpo rochoso insular processos de circulação e armazenamento de água peculiares.

A maior parte da água utilizada nos Açores provém da exploração de massas de água subterrâneas. A irregularidade dos caudais, aliada a dificuldades de captação constituem os principais obstáculos à captação de águas superficiais.

No corpo rochoso das ilhas açorianas podem ser individualizados dois tipos de unidades hídricas subterrâneas: uma correspondente aquíferos suspensos, que resultam da retenção de água na zona não saturada, e outra basal, hidraulicamente governada pela diferença de densidade entre massas de água doce e água salgada proveniente de infiltrações marinhas.

Os aquíferos suspensos surgem na sua maioria associados a lavas e piroclastos dispostos sobre paleossolos argilosos, formados durante períodos de quiescência vulcânica. De um modo geral apresentam águas pouco mineralizadas e com uma microbiologia complexa, associada à elevada vulnerabilidade dos terrenos à poluição e ao pastoreio livre de animais.

Os principais sistemas aquíferos suspensos dos Açores localizam-se no interior de caldeiras (e.g. Nasce Água e Cinco Picos na ilha Terceira) ou nas vertentes de grandes aparelhos vulcânicos (e.g. Serra do Cume, Sete Cidades e Caldeira do Faial). Em regra apresentam caudais muito dependentes das recargas, com grandes oscilações sazonais. 

O aquífero basal desenvolve-se em todas as ilhas. Corresponde a um conjunto de formações saturadas por água doce situadas a cotas próximas do nível do mar em equilíbrio hidrodinâmico com água salgada proveniente de infiltrações do mar. Os principais factores que afectam este dinamismo prendem-se os ciclos de recarga e descarga naturais, oscilações das marés, fluxos geotérmicos e variações na dispersividade do meio.

A entrada de água no aquífero de base faz-se em toda a superfície insular, ocorrendo as maiores recargas nos terrenos lávicos recentes, onde a permeabilidade é maior, e nas zonas mais altas, onde os índices de pluviosidade são mais elevados. Os seus pontos de descarga localizam-se na linha de costa, sobretudo na zona intertidal, sendo popularmente conhecidas por nascentes de maré. A água destes mananciais são por vezes hidrotermais (e.g. nascentes do Carapacho, Ribeira Quente, Varadouro e Águas Santas), ou apresentam quantidades elevadas de dióxido de carbono dissolvido (e.g. Água Azeda do Raminho e Serreta).

Os sistemas de abastecimento de água insulares, assentam na captação de nascentes, poços e furos. As nascentes captadas estão na sua totalidade associadas a aquíferos suspensos com águas do tipo cloretado sódico, embora nalguns pontos sejam bicarbonatadas sódicas, com mineralizações baixas.

A maioria dos poços e furos existentes nos Açores captam o aquífero basal, embora alguns, sobretudo na ilha Terceira e em Santa Maria, captem aquíferos suspensos. As águas basais são maioritariamente do tipo cloretado sódico, embora nalguns poços surjam águas bicarbonatadas sódicas, revelando a grande influência marinha.

O incremento generalizado da extração de água nas massas aquíferas nos Açores obrigam a uma gestão cuidada das disponibilidades para fazer face às necessidades, que se preveem crescentes. Esta deve passar em primeiro lugar pela formação de técnicos especializados, capazes de gerir de forma sustentável um recurso estratégico como a água e pela criação de sistemas de monitorização adequados, que permitam identificar recursos exploráveis, quantificar caudais e avaliar a qualidade do recurso captado.

Francisco Cota Rodrigues

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