O "Há Vida no Campus" considera que chegou a altura de se dar o devido relevo ao autor dos edifícios que compõe o nosso Campus. Jorge Figueira, arquiteto, do Porto, foi o responsável pela conceção de todos os edifícios que compõe o Campus de Angra. Em discurso direto, Jorge Figueira retrata cada um deles, com as suas próprias fotos:
"O primeiro edifício que foi
construído – o edifício do Auditório, Aulas e Biblioteca – foi uma emoção
enorme porque se tratava da peça inaugural do Campus. Decorria de um primeiro
plano cujo programa foi proposto e abandonado pela Universidade dos Açores por
ser demasiado ambicioso; tinha previsto, por exemplo, um grande auditório e uma
biblioteca. Este edifício estava inserido nesse primeiro programa, e a ideia da
Universidade era que o auditório aí previsto pudesse tomar o lugar do outro e
que algumas salas de aula do último piso pudessem ser adaptadas para aí
funcionar uma biblioteca, improvisada.
Um rude golpe aconteceu quando um
técnico, suponho que do Ministério de Educação, vindo do continente, impediu
que o previsto revestimento parcial do edifício, em azulejo, fosse executado.
Corresponde a parte que foi depois pintada de vermelho-tijolo. Felizmente esse
impedimento não ocorreu no átrio exterior que tem esse revestimento, e que acho
que funciona muito bem. Não foi só a imagem do edifício que perdeu mas a sua
durabilidade já que o reboco pintado tem um tempo curto de resistência e o
azulejo ficaria para sempre.
Tenho um grande afecto por este
primeiro edifício. Gosto do átrio exterior em azulejo que marca uma espécie de
espaço cerimonial de acesso ao edifício – não se está dentro nem fora do
edifício, mas a caminho; do átrio verde e das escadas pretas; do espaço de
transição elevado com duas janelas nos topos; e o auditório, mesmo que não seja
o grande auditório que se esperava, penso que tem dignidade e é confortável.
Gosto também muito do tema da
fotografia que escolhi: o volume branco ortogonal sobre o pano de vidro do
auditório, em desafio da gravidade. Está aqui aquilo que seguiríamos nos
próximos projectos: com relativamente pouco meios, e sem excessos formais,
mostrar que o Campus não seria feito com uma arquitectura burocrática ou igual
a tantas outras.
Em respeito pelo lugar, mas sem
subserviência; afinal, não é todos os dias que se ergue uma Universidade; o
edifício queria também dizer isso, sem alarido.
O professor Alfredo Borba foi um
cliente atento, exigente e compreensivo e na minha experiência directa a ele se
deve, particularmente, o arranque desta obra, e a execução das restantes.
O segundo edifício a ser construído
foi o dos Serviços de Acção Social, Desenhado já no contexto da reformulação do
Campus que me foi pedida pela Universidade. A ideia era desenhar um pavilhão
que pudesse funcionar como um primeiro momento de relação com a paisagem e que
permitisse lançar o Campus à cota abaixo da rua entretanto construída. Foi
projectado em relação com o futuro edifício Interdepartamental; os dois
criariam uma praça, momento chave do espaço público do Campus.
A ideia deste edifício foi jogar com
uma forma muito enfática – um edifício em “degraus” – mas não colocados na
direcção da paisagem, como seria mais evidente. Os “degraus” do edifício são
colocados na transversal dessa direcção natural do terreno, em direcção à praça
do Campus e do Interdepartamental.
O que se pretende dizer é que um
edifício é sempre algo de artificial, e que embora possa respeitar a paisagem
não tem que a mimetizar. Por dentro, ao esquematismo dos “degraus” do volume
quis contrapor uma geometria mais refinada como é a que desenha a rampa em
balanço em diagonal que permite o acesso à cantina pela cota alta. É o edifício
mais difícil e mais ambicioso do conjunto.
O Interdepartamental é a grande
estrutura do Campus, e um edifício muito complexo do ponto de vista das
infra-estruturas dos laboratórios das várias áreas de investigação. Passamos
por inúmeras fases, com um diálogo muito exigente com os responsáveis dos
laboratórios e com a nossa equipa de especialidades.
Do ponto de vista urbano, este
edifício tenta resolver um problema: a rua que tinha sido construída dizia
respeito à primeira fase do Campus, de muito maior dimensão e complexidade. De
repente, era uma rua excessiva para a quantidade de edifícios previsto. Por
isso colocamos o edifício em ponte, transversal à rua, como forma de remate.
Depois tratava-se de rentabilizar ao
máximo o pouco espaço que podíamos construir para um tão grande número de
laboratórios e de gabinetes. Por razões de custo, o corredor nunca poderia ser
muito largo por isso tentámos tirar partido do seu comprimento. As rampas e
espaços exteriores tentariam compensar a pequena dimensão que o orçamento
disponível nos exigia.
Do ponto de vista da imagem exterior,
as fachadas teriam que ser muito moduladas e eventualmente sem grande
interesse. Não haveria orçamento para grandes panos de vidro ou soluções
tecnologicamente avançadas. A ideia na fachada dos laboratórios foi usar uma
caixilharia normalíssima e de baixo custo, já que o desenho do alçado seria
feito num plano avançado com peças de grande dimensão de um composto de betão
pré-fabricado. A fachada propriamente dita podia ser banal, porque estes
elementos afixados dariam ao edifício a singularidade e a elegância que o sítio
e o programa exigiam.
Na fachada dos gabinetes quis levar
ao limite a necessária repetição, cobrindo todo o plano com janelas muito
particulares: inspiradas no Yellow Submarine, dos Beatles, o que me parecia
justo já que a presença do mar, no horizonte, cortava-me sempre a respiração
quando visitava o Campus – e os Beatles ensinaram-me a respirar. A linguagem
algo náutica do edifício vem daí.
O Edifício da Associação de
Estudantes é a mais pequena e simples das 4 estruturas, mas tem um papel
fundamental. Cria um primeiro plano, quando se chega ao Campus, já que o
Edifício do Auditório, Aulas, e Biblioteca não foi projectado para ser visto
isoladamente (no projecto inicial havia um edifício no sítio do da Associação
de Estudantes). Mais uma vez, tratou-se de encontrar o máximo de expressão com
poucos meios: o piso da cobertura a funcionar como terraço; a criação de uma
pequena praça entre este e o edifício inaugural.
O pedido para projectarmos uma
“sala de reflexão” deu-nos o motivo para criarmos uma pequena peça que
entendemos como um gesto de boas vindas ao Campus, misteriosa mas, parece-me, com
uma escala e forma amigáveis. O vidro espelhado reflecte as árvores e no
interior está num plano elevado; a reflexão obriga ao corte de uma relação
directa com o exterior. Embora mais modesto tenho um grande afecto por este
edifício, que perdeu as cores dos anteriores, também para marcar uma diferença.
Entendendo-se que aqui são os estudantes que fazem o colorido…
Fizemos ainda o ante-projecto de um
Pavilhão Gimnodesportivo que, implantado à entrada do Campus, seria a peça
chave de relação do espaço do Campus com a cidade. Seria também, ou será, um
edifício radicalmente distinto dos anteriores; como cada um dos 4 é muito
diferente entre si."
O nosso agradecimento ao arquiteto Jorge Figueira. Fica aqui expressa a nossa pequena homenagem ao seu grande trabalho. Bem haja!
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